Os riscos e oportunidades climáticas para o mercado imobiliário

Aproximadamente 39% do total de emissões globais vem da fabricação de materiais usados em edifícios e pelo próprio ativo no seu ciclo de vida, seja através de seu consumo de energia, de recursos naturais e de geração de resíduos.

Este cenário de transição coloca os investimentos imobiliários sob análise de sua correta precificação. Neste sentido, quais os riscos e oportunidades do setor para com as mudanças climáticas?

A Agência Internacional de Energia Renovável estimou em relatório recente divulgado pela McKinsey que US$7,5 trilhões em imóveis podem vir a ficar encalhados no mundo: ativos que sofrerão grandes desvalorizações ou terão necessidades de caras intervenções devido aos riscos climáticos e à transição econômica, tornando o setor imobiliário um dos setores mais atingidos.

E a natural simbiose que tem com o mercado financeiro, envolvido pela pauta ESG, eleva a pressão sobre a atividade e trouxe uma discussão antes meramente periférica para o centro da agenda da construção civil brasileira. Estamos falando de uma indústria que não via sustentabilidade como valor (nem como ameaça), mas agora todo o sistema se encontra pressionado para evoluir.

E a pressão por transformação vem não apenas do mercado financeiro, buscando alocação em iniciativas ESG, mas também do súbito aumento do custo das matérias primas por consequência da COVID e, não menos importante, a pressão do próprio consumidor.

Pode apostar: a busca por menor impacto ambiental, pela presença em um ecossistema menos intensivo em carbono, seja no ativo em si ou no sistema de transporte necessário para o ir e vir, nos riscos físicos como alagamentos e deslizamentos, estará no topo da árvore de decisão do consumidor pelos anos seguintes.

O objetivo é claro: temos 10 anos para reduzir nossas emissões de gases de efeito estufa pela metade para termos chances de neutralidade em 2050 e manutenção das metas estabelecidas pela ciência.

A regulação brasileira está a caminho e em pouco tempo todas as empresas serão obrigadas a medir, reportar e mitigar suas emissões de gases de efeito estufa. O mercado voluntário mostra certa pujança e rápida adesão de empresas e consumidores. E a pressão sobre o mercado imobiliário e toda a cadeia da construção vai aumentar.

O desafio: como construir uma inteligência coletiva para o setor, que contemple os riscos dessa transição econômica, que atenda os objetivos globais de descarbonização, mas se aproveite disso para se alavancar a criação de novos valores e de diferenciação no mercado imobiliário?

A única maneira de reduzir os riscos das mudanças climáticas nos setor imobiliário é descarbonizar seu ecossistema. E o ecossistema aqui refere-se ao ciclo de vida completo (projeto, fabricação de materiais, construção, uso e demolição) de todos os edifícios e infraestrutura a ser construída daqui por diante.

Mas como se descarbonizar em uma indústria dependente do aço e do cimento? Como acompanhar o impacto que estes setores sozinhos também estão passando? E para além do carbono, como lidar com o impacto negativo do grande volume de resíduos de construção gerados, do uso abusivo de água, do alto consumo de energia e da emissão de material particulado nas cidades?

A verdade é que já dispomos de uma série de tecnologias que podem ser alcançadas, mas ainda encontramos um setor exposto culturalmente ao “saber fazer”, refém de um ciclo de mudança longo e de uma cadeia de valor poluente e de baixa qualificação, que impõe ainda mais riscos a todo o mercado.

A descarbonização do mercado imobiliário

Para enfrentar o inimigo, é preciso conhecê-lo: no ecossistema da construção, as emissões de gases de efeito estufa acontecem em 2 frentes principais: 30% na fabricação de matéria-prima para construção da infraestrutura e de edifícios e 70% nas operações do ativo em seu ciclo de vida.

Isso significa que precisaremos de esforços para novos modelos construtivos menos intensivos em carbono e de grandes investimentos em modernização dos ativos existentes.

Mas o fator mais importante de todos na determinação das emissões de gases ao longo da vida útil de um edifício é o projeto. É nele que decisões fundamentais precisam ser tomadas para que o impacto do ativo da construção ao seu ciclo de uso seja minimizado.

Em seguida, é importante olhar o seu negócio e sua contribuição para a cadeia: verificar para suas emissões diretas e principalmente, de sua cadeia de valor. Porque para vender “verde”, é preciso comprar “verde”, e boa parte do carbono do ecossistema vem de fornecedores que ainda estão alheios à pauta.

O problema: em uma transição não planejada, a cadeia de valor deve sofrer um impacto econômico e social negativo por vezes maior que um benefício ecológico, e aqui reside a necessidade de um olhar de transição equilibrada.

A boa notícia é que com a expansão de investimentos em educação e inovação, com o surgimento de novos materiais, da expansão do uso de impressões 3D, da construção offsite e principalmente, do interesse de uma nova geração que assume o desafio da transição, o setor vem observando a gerando valor para suas empresas e para a sociedade com o uso de ações que ao fim, também significam redução de custos.

E é esse o caminho: ao olhar para o impacto ambiental, evolua também com responsabilidade social, equilíbrio econômico e rigor na governança. Há quem chame isso de ESG, mas para um olhar no futuro, devemos considerar isso sim como um novo normal.

Mas precisamos evoluir depressa. Precisamos reduzir a demanda por recursos naturais e aumentar a circularidade de materiais, otimizar a construção e promover a mudança para materiais de baixo carbono, modularizando a construção para fora do local, reduzindo assim a pegada geral do processo.

É preciso também uma abordagem regulatória das autoridades regionais, com um melhor dimensionamento e planejamento do crescimento das cidades, incentivando construções mais sustentáveis, modais de transporte mais limpos e impacto social, ambiental e econômico positivo.

E é preciso atrair o capital: as empresas que inovarem em projetos ou temas de investimentos que apoiem a descarbonização estão mais atraentes do que nunca para fundos comprometidos com a agenda ESG.

A notícia ruim é que se não for tratada, a produção de carbono do ecossistema da construção poderá crescer nos próximos 30 anos, à medida que procuramos atender às demandas de uma população em expansão e aumento da urbanização.

A descarbonização do ecossistema da construção é o maior desafio de inovação do setor e envolve todo o ecossistema. Quem enfrentar o risco, verá agora oportunidades e muita possibilidade de inovação. Quem quiser apenas acompanhar, deve ficar pelo caminho.

Os riscos e oportunidades climáticas para o mercado imobiliário was originally published in economialimpa on Medium, where people are continuing the conversation by highlighting and responding to this story.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *